20.4.06

corredores da justiça

quando recusam explicar a justiça que aplicam "em nome do povo", [é bom não esquecer este pormenor], os magistrados colocam-se a jeito para serem criticados. o discurso do relacionamento mais aberto com a comunicação social e, por via dela, com o público em geral é, salvo raras excepções, apenas isso: um discurso.
podia dar muitos exemplos, recolhidos em escassa meia dúzia de anos de jornalismo, mas, assim de repente, ocorrem-me apenas estes: no contacto com um tribunal, no âmbito de um processo mediático, pedia ao juiz que divulgasse, em comunicado, as medidas de coacção aplicadas a um arguido. "o senhor doutor juiz não autoriza a divulgação", informou a funcionária. argumentei que não pedia um relatório dos factos imputados ao arguido, mas apenas a medida de coacção que lhe havia sido aplicada.
sensibilizada para a argumentação, a funcionária insistiu com o juiz. regressou desanimada. "não vale a pena. o senhor juiz não autoriza. e manda dizer que os senhores jornalistas acabam por saber de qualquer maneira". "de qualquer maneira", entenda-se, através de fontes anónimas…. palavras para quê?!
num outro caso, pedi ao funcionário que me dissesse o nome do magistrado do ministério público encarregue de um processo, ao que aquele me respondeu: "o senhor procurador não autoriza que se divulgue o nome"!
mais recentemente, o acórdão do supremo tribunal de justiça, sobre os maus tratos a menores deficientes, divulgado pelo público, veio "enriquecer" a minha já vasta galeria de dificuldades de relacionamento com o poder judicial.
pedi a um dos visados, porque a notícia estava a indignar o país, que explicasse a decisão, mas aquele informou-me, por interposta pessoa, que não estava disponível.
não acho que os juízes tenham de vir à praça pública explicar todas as decisões que tomam. mas, de vez em quando, bem podiam descer do pedestal. ou então, podiam delegar a tarefa num colega, no presidente do tribunal a que pertencem, no conselho superior da magistratura, em alguém que não se esconda atrás do "dever de reserva".
li o acórdão da polémica e a fundamentação que levou o colectivo a condenar a
funcionária de um centro de acolhimento para deficientes, num caso de maus tratos a menor (o mais grave) e a ilibá-la noutras três situações. entenderam os magistrados que o "bom pai de família", perante estes três casos, podia ter agido da mesma maneira. concorde-se, ou não, com os fundamentos, o tema é sério.
muitos comentadores (e outros tantos jornalistas) discutiram um acórdão que não leram. mais uma vez: quem não conhecia dispôs-se logo a comentar, na televisão, na rádio e nos jornais. e quem podia ter sido uma mais valia no debate fez-se de morto.
cláudia rosenbusch